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Alessandra Mara Cornazzani Sales

Assessora e Professora da Escola Superior de Contas e Gestão Pública Conselheiro Eurípedes Sales do Tribunal de Contas do Município de São Paulo


O art. 22, inciso XXVII da Constituição Federal, na redação da Emenda Constitucional nº 19 de 1998, atribuiu à União competência exclusiva para também legislar sobre “normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1°, III”.
Em âmbito nacional, a Lei Federal nº 8.666/93 foi editada, com conteúdo preordenado à definição de conceitos, princípios, requisitos processuais preparatórios, etapas e julgamento da licitação, hipóteses de contratação direta, formalização e gestão contratual, sanções, responsabilidades e mecanismos de controle dos atos praticados.
No que tange ao procedimento licitatório em si, em apertada síntese, os pressupostos de idoneidade jurídica, técnica e financeira, determinados pelos arts. 28 a 31 da Lei 8.666/93, constantes do envelope denominado “Documentos da Habilitação”, passaram a ser o primeiro item de análise e julgamento no pleito licitatório, consolidando a etapa de habilitação; as propostas de preços unitários e global oferecidos pelos participantes devidamente habilitados e constantes do envelope “Proposta Comercial”, o segundo quesito a ser observado pela Administração, autorizando a concretização da etapa de classificação; a homologação da licitação e a adjudicação do seu objeto ao vencedor pela Autoridade Superior competente, após regular exame de eventuais recursos, a última etapa do procedimento licitatório. Desse modo é como se conforma a fase externa da licitação, prescrita no art. 43 do diploma legal citado, de conhecimento público, irrestrito e publicado em todos os seus termos.
Em 2002, novo modelo de julgamento licitatório foi introduzido no ordenamento jurídico brasileiro, com a edição da Lei 10.520 e a criação de uma nova modalidade licitatória, o pregão.
A condução dos trabalhos da fase externa é iniciada com uma etapa de credenciamento de empresas, destinada a legitimar a participação dos interessados na competição da etapa de lances, seguinte. Na sequência, é promovida a abertura das propostas comerciais, em primeiro lugar, para que selecionados sejam pelo menos três menores preços para disputa subsequente, e de forma verbal, dos preços apresentados, em lances verbais sucessivos, até obtenção da melhor oferta. Após referidas etapas – classificatória e de lances - é que, então, se processa a abertura e exame dos documentos de habilitação, exclusivamente, da empresa detentora da melhor oferta de menor preço, efetivando-se a etapa habilitatória. Após eventual apresentação de recursos, a adjudicação do objeto a esse licitante vencedor e a homologação do certame conduzem ao fechamento dos trabalhos licitatórios respectivos.
Em regra, o que se implementou ao rito processual licitatório até então conhecido e descrito pela Lei 8.666/93 foi a inversão da etapa habilitatória pela classificatória, convencionada pela doutrina e jurisprudência especializada como, simplesmente, “inversão de fases”.
Por inaugurar rito procedimental mais célere, desprovido de perda de competitividade e isonomia entre os proponentes ou, ainda, de comprometimento à seleção da proposta mais vantajosa para a Administração, referida “inversão de fases”, própria da modalidade pregão, acabou contagiando o processamento das demais modalidades licitatórias previstas na lei geral de licitações1.
Em 2005, a Lei Federal 8.987/95, que trata das outorgas de obras e serviços públicos à exploração em regime de concessão e de serviços públicos ao regime de permissão, recebeu um novo dispositivo legal com a edição da Lei 11.196 que permitiu a adoção dessa inversão da ordem das etapas habilitatória e classificatória, inclusive a aplicação da etapa de lances verbais2.
A Lei nº 13.121/08, que regulamenta os processos de licitação e de contratação no Estado de São Paulo também adotou referida inversão de fases, assim como a Lei nº 13.278/02, em sede do Município de São Paulo, por seu art. 16.
Restringindo-se o debate sobre referida alteração na norma municipal, entretanto, o que se verifica em sede judicial é que mesmo em plena condição de validade sua legalidade tem gerado interpretações de dimensões diversas, por vezes, no sentido de dever ser afastada a sua aplicação.
A Colenda 5ª Câmara de Direito Público do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo, em sede de Apelação, ratificou o julgamento proferido em primeira instância de nulidade de Concorrência Pública promovida pela Companhia Municipal de Habilitação – COHAB, por também entender ter sido afrontada a ordem de processamento das etapas de habilitação e classificação ditadas pelo art. 43 da Lei 8.666/93. Como sustentado pelo MM. Desembargador Relator, “nos termos do art. 30, II, da CF, de fato pode o Município suplementar as normas de licitação, ajustando-as naquilo que for necessário as regras do certame municipal, mas jamais se contrapor às normas gerais estabelecidas na legislação federal, como ocorreu no presente caso por afrontar, inclusive, os Princípios da Legalidade e da Isonomia”3.
Em sentido contrário, sobre matéria fática de mesma natureza, a Colenda 12ª Câmara de Direito Público, por sua vez, compreendeu não ter havido afronta à norma federal, na medida em que a Lei 14.145/06, que introduziu a ”inversão de fases” na legislação municipal, se encontra em plena vigência e conforme à lei de licitações, não tendo havido infringência ao princípio do procedimento formal a justificar, inclusive, a decretação de sua nulidade, haja vista, em especial, a ausência de dano às partes. Subsidiando-se da manifestação da douta Procuradoria de Justiça, lembrou que as fases procedimentais das propostas e habilitações previstas na Lei 8.666/93 estariam contidas na norma municipal, tratando-se a questão da “inversão de fases” “mera opção administrativa que não se eleva à categoria de ilegalidade e tampouco causa prejuízo aos licitantes, até porque a ordem dos fatores não altera o produto na espécie vertente”4.
Ratificando esse mesmo entendimento foi como julgou a Colenda 10ª Câmara de Direito Público em recurso de apelação promovido pela COHAB5. O v. Acórdão trouxe à colação apontamentos doutrinários de que nenhum óbice existiria na adoção da inversão de fases, já que não haveria impedimento ao Município em disciplinar de modo mais racional e eficiente a norma geral que, além de efetivamente respeitada, não teria deixado de constar no edital referida forma de julgamento da licitação em voga.
Ambos os posicionamentos, favoráveis à aplicabilidade e vigência do art. 16 da Lei Municipal nº 13.278/02, contudo, encontram-se pendentes de recurso. Uma questão, portanto, a merecer ainda atenção e acompanhamento.


Notas

1. Conforme denominação dada pelo Decreto Federal nº 3.555/00 que regulamenta o pregão em âmbito federal, art. 5º: “a licitação na modalidade de pregão não se aplica às contratações de obras e serviços de engenharia, bem como às locações imobiliárias e alienações em geral, que serão regidas pela legislação geral da Administração” (g.n.)
2. “Ex vi” art. 18-A, incluído na Lei 8.984/95.
3. TJSP, Ap.9075203-68.2007.8.26.0000, 5ª Câm.Dir.Público, Des.Rel.Franco Coccuza, julg. em 14-fev-2011. Decisão em difinitivo, com trânsito em julgado em 03-jun-2011.
4. TJSP, Ap. 0162779-58.2007.8.26.0000, 12ª Câm.Dir.Público, Des.Rel.Osvaldo de Oliveira, julg. em 09-fev-2011. Embargos de Declaração em tramitação.
5. TJSP, Ap.741.307.5/3-00, 10ª Câm.Dir.Público, Des.Rel.Urbano Ruiz, julg. em 09-fev-2009. Embargos de Declaração e Agravos de Instrumento em Recursos Especial e Extraordinário em processamento.


Os artigos aqui publicados não refletem a opinião da Escola de Contas do TCMSP e são de inteira responsabilidade dos seus autores.


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