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*Danilo André Fuster

Onde não existem os requisitos para o desenvolvimento, o capitalismo monopolista cria seu próprio espaço. Segundo o autor, isto fica bem evidente no Brasil nos Governos de Juscelino Kubitschek e dos militares. Já no espaço entre estes governos a iniciativa privada interna e o Estado conseguem defender-se para enfrentar a transição que seria a conquista econômica externa. Porém, depois da consolidação dos militares houve a consolidação de estruturas e dinâmicas que favoreciam as corporações. 

O significado histórico-sociológico dessa transição, segundo o autor, decorre do fato que a burguesia brasileira não conseguiu levar à cabo a revolução industrial nas condições com que se defrontava, perdendo sua “oportunidade histórica”, já que estava fora de seu alcance neutralizar os ritmos desiguais de desenvolvimento do capitalismo. Assim, a periferia atrasou-se em relação às economias centrais, que a engolfaram em sua própria transformação.

Assim, segundo Florestan Fernandes, mantida a articulação, não se pode esperar que o capitalismo monopolista nos reserve algo melhor que o capitalismo competitivo.
Segundo o autor, existiam alternativas para organizar a política econômica, mas a burguesia não as considerava. Além disso, o Estado não serviu de contrapeso, já que aderiu ao modelo da grande corporação “capitalismo de Estado”, sendo instrumental e funcional apenas para os interesses privados.

Em seguida, Florestan elabora três questões as quais responde no restante do capítulo “Natureza e etapas do desenvolvimento capitalista”, são elas: Como se processa a solução da crise do poder burguês, no plano econômico? Quais são as principais conseqüências e repercussões imediatas do novo padrão de desenvolvimento capitalista sobre a economia brasileira? O que a referida transição representa para as classes antagônicas à dominação burguesa?

Na resposta da primeira questão, Florestan argumenta que o estilo de dominação da burguesia reflete muito mais a situação comum das classes possuidoras e privilegiadas que a presumível ânsia de democratização, de modernização ou de nacionalismo econômico de algum setor burguês mais avançado (FERNANDES, 2006: 307). O autor ainda defende que a evolução que resultou da predominância dos ritmos econômicos, tecnológicos e históricos externos levou à crise do poder burguês ao subterrâneo da história convertendo-a em uma crise verdadeiramente estrutural.

Assim, a crise do poder burguês decorreu, principalmente, do fato da falta de adaptação da dominação burguesa às condições econômicas que se criaram, graças ao desenvolvimento capitalista induzido, regulado e acelerado a partir de fora. Assim, a superação da crise dependeria dos seguintes fatores: (i) da capacidade da iniciativa privada interna de captar as irradiações econômicas das grandes corporações, das nações capitalistas hegemônicas e do mercado capitalista mundial; (ii) da capacidade de mobilização social e política da burguesia; e (iii) da possibilidade de converter o Estado em eixo político da recomposição do poder econômico, social e político da burguesia.

Já na resposta da segunda questão, Florestan argumenta que o maior desafio para o capitalismo monopolista consiste em cavar um nicho para si próprio. Segundo ele, o capitalismo monopolista terá de adaptar-se para coexistir com uma variedade de formas econômicas persistentes. Assim, ao adaptar-se às estruturas e dinamismos de economias capitalistas dependentes e subdesenvolvidas ele se associa à velhas iniqüidades econômicas e gera novas iniqüidades, atraindo novos e velhos descontentamentos sociais e políticos.

Com isso, Fernandes argumenta que o capitalismo monopolista só poderá prevalecer se for capaz de oferecer uma alternativa real em face do socialismo, já que impô-lo seria uma técnica precária, que se esgotaria em algumas décadas.

A partir daí, o autor defende que a irrupção do capitalismo monopolista cria pressões extremamente fortes sobre a organização, o funcionamento e o desenvolvimento das economias capitalistas periféricas. Assim, sob o capitalismo monopolista, o desenvolvimento desigual da periferia se torna mais perverso e “envenenado”, mantendo, alargando e aprofundando a dependência, ao mesmo tempo em que agrava o subdesenvolvimento. Além disso, a transição para o capitalismo monopolista impõe tendências de concentração social da riqueza que não podem ser atenuadas com o tempo. Além disso, sob o capitalismo monopolista, o imperialismo torna-se um imperialismo total, não conhecendo fronteiras e nem freios, de modo a operar a partir de dentro e em todas as direções.

Já na resposta da terceira questão, Fernandes disserta que sob o capitalismo monopolista há uma “compressão política” dura e sistemática, de modo que o espaço é político aberto, democrático e flexível apenas para os membros das elites e das classes dominantes que se identificassem com os propósitos econômicos, sociais e políticos. Já os divergentes estavam sujeitos à repressão e ao ostracismo.

No entanto, o autor defende que enquanto existir capitalismo haverá classes sociais, de modo que as relações de classes terão de passar por processos de acomodação, competição e conflito das classes entre si: “A dependência e o subdesenvolvimento não eliminam este fato” (FERNANDES, 2006: 323). Além disso, segundo o autor, se houve uma alteração do padrão de desenvolvimento capitalista no Brasil, isso significa que ocorreram transformações também na base econômica das classes sociais e nas suas relações, de modo que o conflito de classes continua existindo.

Assim, segundo o autor, o novo padrão de desenvolvimento capitalista está ampliando e aprofundando as desigualdades econômicas, sociais e políticas, de modo a promover alterações nos mecanismos de consciência de classes. Vários fatores ajudaram para que isso acontecesse, um deles advém do monopólio das vantagens pelas classes dominantes, além do aumento do número de migrações para as grandes cidades, da resistência à reforma agrária e a relutância em universalizar as relações de mercado no campo. Assim, o povo muda de configuração estrutural e histórica, e o proletariado adquire um novo peso econômico, social e político dentro da sociedade brasileira: “Ao consolidar e ao dar novos rumos à industrialização, o novo padrão de desenvolvimento capitalista se associa, queira ou não à burguesia, à multiplicação e ao fortalecimento das condições favoráveis aos movimentos operários e à disseminação do conflito de classes segundo interesses especificamente operários” (FERNANDES, 2006: 326).

Assim, a participação econômica assegurada pelos níveis salariais tenderá a aumentar continuamente, fortalecendo a consolidação de formas autônomas, autodefensivas e agressivas de comportamento de classe no meio operário. Assim, ter-se-á conseqüências diretas e indiretas da intensificação constante e crescente participação econômica das classes operárias para os indivíduos e grupos que as constituem. Além disso, o aumento do nível cultural médio dos membros individuais e dos grupos que constituem as classes operárias tenderá à socialização burguesa e ao novo tipo de operariado (renovação do movimento sindical). Se antes a classe média se originava de estamentos, hoje há a possibilidade de mobilidade social (operários podem virar classe média) que pode levar a democracia burguesa ou ao socialismo.
Aqui, deve ficar claro a diferença entre classe estamento. Para o autor, classe se define na base de critérios econômicos e na disputa pelo poder em diferentes esferas. Já o estamento se dá na base de privilégios. Para Cohn:

“(...) no estamento um conjunto de indicíduos se agrega conforme um critério de inclusão ou exclusão no desfrute de uma série de vantagens vinculadas ao intercâmbio social(...) a organização social é como que voltada para dentro. (...) a classe associa os seus membros conforme um critério que premia o sucesso na disputa pelo aproveitamento de oportunidades, sobretudo econômicas, oferecidas na sociedade sem respeitar limites.” (CONH, 1999: 397)

A transformação em curso altera o próprio padrão de composição e de funcionamento do regime de classes. O aparecimento de tensões de classes mais fortes e inevitável fermentação política criam interferências estruturais e históricas que nunca existiram, expondo o poder burguês a novas tensões. Assim, as classes dominantes buscarão aliados fora de suas fronteiras, voltando-se também para as classes baixas. Tem-se, deste modo, o fim do “monolitismo”.

“A visibilidade dos interesses externos e da dominação externa não pode mais ser encoberta sob o manto da “iniciativa privada” que opera a partir de dentro, na era do capitalismo e do imperialismo total. A incorporação da periferia às economias capitalistas centrais, às nações capitalistas hegemônicas e às estruturas capitalistas internacionais de poder aparece nua e cruamente como ela é, sem que o “monolitismo” do poder burguês periférico possa dissimular a natureza e as conseqüências do processo”. (FERNANDES, 2006: 333)

Portanto, tudo o que vimos acima nos leva a crer que a revolução burguesa no Brasil representa, paradoxalmente, a crise do poder burguês. A burguesia não conseguiu conciliar revolução econômica e revolução nacional, por isso, coube ao Estado a tarefa de ser o elo entre os interesses privados e o poder público.

“No momento mesmo em que instaura o seu poder de dominação e de controle do Estado segundo padrões autocráticos, a burguesia se defronta com efeitos ou com exigências do desenvolvimento capitalista que afetam as bases de seu poder real como classe.” (FERNANDES, 2006: 334).

Assim, segundo Fernandes tal fato abre três alternativas para o futuro: um autêntico “nacionalismo burguês” e uma “democracia burguesa”; uma “revolução dentro da ordem pró-capitalista, mas antiprivatista e antiimperialista; ou uma “revolução contra a ordem” e antiburguesa.” (FERNANDES, 2006: 334).

Palavras chave: Celso Furtado, Brasil, Subdesenvolvimento, Pensamento Econômico, CEPAL, Florestan Fernandes, Capitalismo, Desenvolvimento.

*Danilo André Fuster - Servidor público do município de São Paulo atuando como professor na Escola de Gestão e Contas Públicas Conselheiro Eurípedes Sales do Tribunal de Contas do Município de São Paulo, Bacharel em Gestão de Políticas Públicas pela EACH-USP e mestre em Gestão de Políticas e Organizações Públicas pela UNIFESP.


REFERÊNCIAS:

COHN, Gabriel. “Resenha de A revolução burguesa no Brasil”. In: Introdução ao Brasil: um banquete nos trópicos. Org: Lourenço Dantas Mota, São Paulo: Ed. Senac, 1999. Pp. 394-412.

FERNANDES, Florestan. A Revolução burguesa no Brasil. São Paulo, Globo, 2006. Cap. 6. “Natureza e etapas do desenvolvimento capitalista
OLIVEIRA, Francisco. “A navegação venturosa”. São Paulo: 1981.


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